VIVER COM CERATOCONE



As coisas mais importantes da nossa vida, nunca são decididas por nós. Não escolhemos a data em que nascemos, a data em que morremos, a família que vamos ter, as doenças que nos vão aparecer, as pessoas por quem nos apaixonamos. Já pensava nisto antes de descobrir o ceratocone. A doença só o veio provar.
 Em Maio de 2016, comecei a sentir a vista trémula e desfocada. Procurei o meu optometrista que percebeu que tinha que mudar a graduação dos meus óculos. Porém, ele achou isso estranho, visto que nem há um ano tinha adquirido os óculos. As lentes novas chegaram e resolveram o problema.
 No final de janeiro de 2017, voltei aos mesmos sintomas: visão desfocada, dificuldade em focar, visão trémula. Desta vez, além de procurar o meu optometrista, fui também às urgências. Não me detetaram nada de anormal, só me foi dito que deveria mudar a minha graduação. Assim o fiz. Pedi umas lentes novas. Entretanto, tive a minha primeira consulta no serviço de oftalmologia onde me foi dito que tinha «qualquer coisita» na córnea, foi-me dito que devia andar em vigilância, mas para voltar no ano seguinte.
 Duas semanas depois, do nada, enquanto via televisão, começo a ter visão dupla. Achava estranho ter visão dupla só com as coisas que envolvem luz. Comecei a olhar para a lua e ver duas, os candeeiros da rua também duplicavam, o mesmo acontecia com as letras brancas em fundos escuros. Durante o dia, essa sensação era quase inexistente, mas à noite era bem presente. Fui parar às urgências, fui visto por uma neurologista que me pediu um TAC. Fi-lo e o resultado foi: nada. Eu não tinha rigorosamente nada. Não havia algum problema com o cérebro. Eu sabia que isso era um problema dos olhos.
 O meu médico de família pediu uma consulta de urgência para a oftalmologia que foi marcada para quatro meses depois. Habituei-me a viver com essa sensação de visão dupla. «Podia ser pior!», dizia para mim mesmo. Não havia nada que eu pudesse fazer para tudo isto desaparecer. Não era uma escolha minha. Não bastava em querer mudar as coisas, era preciso que a vida, o universo, ou seja lá quem for que decide tudo isto por nós, também o quisesse.
 Entretanto comecei a perceber que a minha visão lateral estava a encurtar. Comecei a ter dificuldade em medir distâncias laterais. «É só mais uma coisa que tens que aguentar!», repetia para mim. Estava a pressentir que isto não ia ser pêra doce, todas as minhas pesquisas pela internet anteviam coisas menos agradáveis, já sabia que tinha ceratocone mesmo antes de ter o resultado da topografia corneana que fiz em Julho de 2017, na consulta de oftalmologia que demorou quatro meses a chegar. Nessa consulta só me foi explicado que estava proibido de coçar os olhos. Fui encaminhado para outro hospital, para um oftalmologista de córnea. Mais quatro meses de espera me aguardavam.
 Já passou um ano, já tive duas consultas com o meu médico. Em janeiro de 2018, tinha a doença estabilizada, mas no decorrer destes cinco meses ela já evoluiu. A minha visão lateral é praticamente inexistente, há dias mais desfocados e complicados do que outros, os meus óculos já não me servem de nada. Já não tenho «prazer» em conduzir e em tantas outras coisas. Ver filmes é complicado, ou vejo o rosto dos atores ou vejo as legendas. Porque tudo aquilo para onde eu não estou a olhar diretamente, fica desfocado. O ceratocone é difícil de suportar, principalmente por ser uma doença progressiva, que só tem tendência a piorar. Os meus pais achavam que esta doença vinha das muitas horas no computador, mas o médico descartou essa teoria. O ceratocone ou é genético ou é proveniente de alergias. Nunca tive alergias. Só pode ser genético. Embora na família não conheça mais nenhum caso.
 Mas de uma coisa eu tenho a certeza, eu não vou deixar que esta doença me consuma, eu acredito que encontrarei uma solução, sei que vou ter dias mais complicados, que vou temer o futuro, porque não sei o que posso esperar, se terei que chegar ao ponto de me submeter a um transplante... sei que provavelmente terei que me adaptar a muitas coisas, mas vou continuar de pé, dê por onde der, custe o que custar. Só tenho uma vida para viver e quero vivê-la fazendo as coisas de que gosto. Escrever, viajar, conhecer todos os lugares do mundo que sonho desde sempre.
  Faço parte de grupos com pessoas que passam pelo mesmo que eu. Leio os seus testemunhos e sei o quanto sofrem, o quanto se sentem limitadas, o quão duro é passar por uma situação que não foi escolha nossa. Mas a vida é que sabe, não adianta ir contra ela. Nos momentos menos bons, há que acreditar que vamos encontrar uma solução. O ceratocone é difícil, mas há coisas piores. A nossa vida não está em risco e a visão só é 100% desfocada sem o uso de óculos ou de lentes. Sei que as lentes esclerais, devolvem às pessoas praticamente a sua visão total.
  Rodeiem-se de amigos e de pessoas alegres que vos puxem para cima. Nunca desistam. Haverá uma solução.

INSTAGRAM: @fabioteixeira7

Fábio Teixeira


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