A minha última carta de amor para ti
Hoje acordei na mesma cama de hospital que me acolhe há várias semanas. O dia amanheceu cinzento e a chuva cai firmemente fora do quarto. As enfermeiras olham-me tristes. Elas não fazem a mínima ideia que as ouvi declararem a minha morte para as próximas horas. Sei que vou morrer e que desta vez não serei mais forte que a doença. Mas é assim a vida: quando se é velhinho, a morte espreita em todas as esquinas. Vivemos a vida com o conhecimento claro de qual será o nosso último destino. Um dia vamos ter de ir ao seu encontro.
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Olho para fora da janela. O céu está cinzento, o vento abana as árvores que rodeiam o hospital. A chuva cai em catadupa. As lágrimas rolam pela minha cara com a mesma intensidade que a chuva cai lá fora. Não consigo falar e abrir os olhos custa-me. Ainda assim, com as poucas forças que ainda me restam, sento-me na cama. Preciso escrever-te pela última vez. Preciso abrir-te o coração que dentro de algumas horas irá deixar de bater. Levo a mão à gaveta da cómoda e tiro o meu bloco de anotações. Pego na caneta. Preciso escrever-te.
«Meu amor, o meu coração vai parar de bater dentro de algumas horas. Não há mais esperança para mim. A chuva que cai lá fora cai também dos meus olhos. Não estou triste por morrer. Estou triste por deixar-te. Ainda que a vida nos tenha afastado há mais de 50 anos, eu nunca me separei de ti. Trouxe-te junto a mim nas recordações, nas fotografias que nunca rasguei nem queimei, no amor que sinto por ti desde o dia em que nos cruzámos. Trouxe-te junto a mim, nos meus pensamentos, no meu coração, na alma que te reconheceu como sendo a sua metade. A vida uniu-nos e afastou-nos, fez-me apaixonar por ti e assim fiquei até ao dia de hoje. O dia da minha morte.
Foram tantas as noites em que não dormi à espera do teu regresso, foram tantos os dias em que a única coisa que desejei foi a tua presença. Sabes que todas as vezes que entrei num bloco operatório a última imagem que via era o teu rosto? E quando acordava, a única coisa que eu queria sentir, era a tua mão na minha. Houve momento em que fechei os olhos com toda a força por não conseguir suportar a vida sem ti, tal como houve momentos em que cantei e dancei, feliz, por te amar.
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Nos lugares que conheci, nos pratos que saboreei, nas viagens que fiz, nos textos que escrevi, na arte que inventei, no bom e no mau, na alegria e na tristeza, mesmo distante estiveste sempre presente. Eu fiz-te presente na minha vida porque nunca me imaginei sem ti dentro dela. Há coisas que são como doenças crónicas e que nos vão acompanhar para sempre; o meu amor por ti é uma doença crónica com quem eu aprendi a conviver sem sofrer.
Às vezes isso incomodava-me muito. Ficava triste e revoltado. Houve dias em que me senti tão vazio e deserto, como se dentro de mim não existisse nada, como se o meu coração não estivesse dentro do meu corpo e a minha alma tivesse voado para longe. Houve dias em que a dor de estar sem ti conseguia ser mil vezes pior do que lâminas a cortarem-me a pele.
Para todas as doenças há remédio para abrandar a dor mas para a dor da separação não existe nada. Fui forte e guerreiro, aguentei-me firme. Acreditei com todas as minhas forças que um dia voltarias, que um dia, assim, sem mais nem menos, reconhecerias a minha alma como a metade da tua. Foi a isso que me agarrei nos piores dias, nos piores momentos da minha longa trajetória até aqui. Mas tu nunca vieste, nunca me reconheceste. Até hoje. O dia da minha morte.
Sabes que não houve um único dia em que não pensasse em ti? Foram tantos os filmes, as músicas, os lugares, os sabores, os momentos que quis partilhar contigo. Quis tanto partilhar a minha vida contigo. Nunca houve nada que eu quisesse mais. Nem mesmo quando estive doente, quando fui submetido a operações, a exames, a tratamentos. Nesses momentos eu só queria a tua presença, olhar para o lado da cama e ver-te lá, a sorrir para mim, a dizer-me que tudo ia passar.
Lembrei-me tanto dos nossos momentos. Dos momentos em que fomos só nós os dois. Como se não existisse mais nada à nossa volta. Lembrei-me sempre das nossas mãos entrelaçadas para despistar o frio, dos olhares que cruzámos quando não podíamos tocar-nos, das promessas que fizemos mesmo sabendo que o futuro era o lugar mais incerto de sempre. E enquanto te escrevo estas linhas, lembro-me dos teus olhos cor de mel, da tua voz e do teu jeito. Na verdade, eu não posso dizer que me lembrei ou que me lembro porque na verdade eu nunca esqueci. Eu nunca esqueci nada. Eu nunca me esqueci de ti. Lembrei-me sempre do teu aniversário, do dia em que tiraste a carta de condução e conduziste o meu carro, do dia em que me disseste ‘amo-te’ pela primeira vez, dos dias que passámos juntos. Nunca me esqueci das datas que marcaram a nossa história e o meu coração.
Agora que o ar entra nos meus pulmões pelas últimas vezes, quero que saibas que te esperei até ao meu último suspiro, que acreditei em nós até ao último dia da minha vida e que te amei… amo, amarei, porque o meu amor por ti vem da alma e a alma nunca morre, nunca esquece, nunca apaga nada. Quando fechar os olhos e o mundo ficar escuro, sei que o meu amor por ti estará lá comigo. Sei que tu estarás lá comigo. O meu amor por ti foi a melhor companhia da minha vida. Eu sofri muito por ti, chorei tanto, senti-me a desfalecer tantas vezes, mas valeu a pena. Porque amei. Amei de verdade, com toda a entrega, com todo o coração, com toda a alma. Amei. E tantas pessoas morrem sem ter esse privilégio.
Talvez tenhas passado estes anos todos a pensar que te odiava pelas coisas erradas que fizeste comigo. Quero que saibas que a mágoa e a dor que me causaste nunca foram superiores ao amor que tenho por ti. Eu amo-te de um jeito totalmente incondicional. O que sinto por ti é um amor tão transcendental que vence e ultrapassa tudo.
Continua feliz onde quer que estejas. Do outro lado estarei a olhar por ti como tanto quis fazer durante a vida inteira. Prometo dar-te os beijos de boa noite que nunca consegui dar e abraçar-te nos momentos em que te sentires como um deserto infinito.
Hoje é o dia da minha morte mas não o dia do fim. Talvez seja um novo recomeço. Para mim e para ti. Para nós e para os planos que não conseguimos realizar.
O meu coração vai parar de bater, meu amor. Amar-te-ei do outro lado.“
Pouso a caneta e fecho o bloco de anotações. Chegou a minha hora de partir. Olho para o lado de fora da janela. O céu cinzento abre-se para me receber enquanto a chuva que cai lá fora abranda nos meus olhos. Sinto-me leve. Já não respiro mais. Finalmente parti.
Fábio Teixeira
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