É no peito dele que gosto de sonhar com o futuro que posso não ter.


     O corredor tem apenas pequenas luzes de presença que pouco ou nada iluminam o espaço. Não há vestígios dos enfermeiros ou auxiliares. Na maioria dos quartos as portas estão entreabertas. O silêncio é acolhedor. Com passos curtos e cambaleantes, devido à anemia que não me larga, passo pelo quarto do senhor José, da dona Margarida, da Celeste, do Josué, da Emília e do Rafael. Convivo com todos eles há um ano e conheço a história de vida, os familiares e os amigos de cada um. Eu já os sinto como se fossem a minha segunda família porque, apesar das idades diferentes e das histórias distintas, criámos laços fortes que nos unem e nos enlaçam para sempre uns aos outros. Apoiamo-nos e consolamo-nos uns aos outros porque todos nós entendemos o sofrimento de cada um. Como diz a senhora Margarida: somos companheiros de guerra.

ESTÁ A LER UM EXCERTO DO LIVRO 'ANTES DE DIZER-TE ADEUS'

LIVRO À VENDA

"«Antes de dizer-te adeus» é um livro que nos faz refletir sobre a vida, sobre a importância de vivermos o presente, sobre o poder milagroso do amor e sobre a tão indesejada morte."

"Uma escrita simples e brilhante. Um livro emocionante com uma mensagem clara: não podemos nem devemos deixar a vida e as pessoas para depois."


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  Antes de chegar à pequena sala de convívio localizada ao fundo do extenso corredor, a respiração acelerada do Rafael capta a minha atenção. Em silêncio, entro no quarto dele. O seu aspeto debilitado deixa-me agoniada. Em segundos sinto-me a ser consumida por uma onda violenta de desespero. O seu peito sobe e desce continuamente. O seu rosto redondo está coberto por uma bomba de oxigénio que lhe faz tremer as bochechas pálidas. A sua garganta emite um som arrepiante, difícil de descrever, que me aperta o coração.
   Sei o que isto significa.
   Um dos meus companheiros de guerra está prestes a partir.

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   Aproximo-me da cama, coloco a minha mão em cima da dele e rezo. Rezo muito. Imploro que Deus o receba com todo o amor que ele merece.
  O Rafael travou várias lutas ao longo da vida. Na escola foi vítima de bullying durante anos por ser “diferente”. Foi humilhado, gozado, maltratado, espezinhado por pessoas que o consideravam menos só porque ele não gostava de futebol e só tinha amizades com raparigas. Apesar de ser rotulado de gay, de maricas ou de larilas, ele nunca se deixou abater por isso e sempre se manteve de pé, fiel a ele mesmo e aos seus valores e princípios. Quando se apaixonou perdidamente pelo Elmin, a sua vida virou do avesso. Mais uma vez o preconceito venceu o amor e eles ficaram separados. Vinte anos depois reencontraram-se e o amor do passado voltou com toda a força. A separação tornou-os pessoas mais fortes, mais independentes, mais maduras, mais estáveis e, por isso, conseguiram ficar juntos depois de tantas lutas, separações e oposições. Há amores que levam tempo para acontecer. O deles levou vinte anos.
   «O Elmin é o meu porto seguro, sabes? É a ele que me agarro quando estou prestes a desistir. É no peito dele que gosto de sonhar com o futuro que posso não ter. Esperei por ele vinte anos e esperaria toda uma vida. Quando uma pessoa é o grande amor da nossa vida, não há nada que nos faça esquecê-la», disse-me o Rafael, durante uma noite de insónias.


  O Rafael é tão ou mais romântico do que eu. Acho que foi isso que nos aproximou tanto. A história dele e do Elmin é uma referência para mim.
    E agora só me resta lamentar por vê-lo sucumbir à doença.
   O cancro está prestes a vencê-lo e isso deixa-me revoltada por tamanha injustiça. O Rafael sempre foi tão batalhador, enfrentou os tratamentos sempre com alegria e positivismo. Nos meus piores dias, ele ia ter comigo ao meu quarto e arrancava-me gargalhadas estrondosas que faziam a minha barriga doer.
   Mas apesar da revolta e da injustiça, eu sei que ele partirá feliz.
 Vai partir com o seu maior sonho realizado.
  «Sabes o que me deixa mais tranquilo com a ideia da morte? É saber que vivi o grande amor que queria viver. A minha morte seria tão triste e sem sentido se eu tivesse passado toda a minha vida sem o Elmin.»


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