O QUE DE VERDADE IMPORTA
Vivi com a minha avó, na mesma casa, quinze anos. Estive ao lado dela até ao fim. Durante os seus últimos dois meses de vida, acompanhei-a às diversas consultas, fiquei com ela, durante horas, a olhar para as paredes do hospital, tratei dela dia e noite, porque estava acamada, levei-a a passear na cadeira de rodas, decorei o nome de todos os seus medicamentos, fui o auxiliar do enfermeiro todas as vezes em que ele a cuidou, e quando não havia mais o que fazer, conversava com ela. Às vezes, ela estava demasiado debilitada, com poucas forças para falar. Olhava para ela e admirava a garra com que estava a enfrentar, talvez, a maior batalha da sua vida. Tantas vezes a olhei enquanto ela dormia, imaginando o dia em que ela partiria. Mesmo sabendo do seu estado critico, eu acreditei sempre que era só uma fase ruim que logo passaria. Lembro-me de ir escolher a roupa para ela levar no caixão e perguntar a mim mesmo o porquê de o estar a fazer. Para mim ela não ia morrer. E tudo o que fiz pela minha avó, foi porque o devia a ela, por tudo o que fez por mim e pela forma como sempre me amou, me defendeu, se doou a mim e aos meus.
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Fui criado com os meus avós e não há dia em que não me lembre da presença deles na minha vida.
Há uma coisa que eles sempre me transmitiram: o valor da família. A minha avó gostava de ter a família toda à mesa, gostava de estar na companhia de todos os que ela amava e para ela não havia nada melhor do que isso. Sou muito como a minha avó: priorizo sempre a minha família. Porque quando tudo cair, quando o dinheiro não cobrir uma doença ou uma tragédia, é a família que vai lá estar, é o sangue que falará mais alto.
A última imagem que tenho da minha avó, é dela deitada numa cama de hospital, com uma bomba de oxigênio a entupi-la de ar, e dela me pedir a mão para a ajudar a virar-se para mim. Lembro-me tão bem dos seus olhos azuis, inundados de lágrimas, a olharem para mim como se me quisessem dizer: «Estou a tentar, mas não estou a conseguir!». Quis chorar também, mas lembrei-me sempre de todas as vezes em que ela dizia sentir-se mal para não me dizer que tinha dores. Não chorei porque eu sabia que ela queria que eu fosse forte como ela estava a ser.
Todas as vezes que fui com a minha avó às consultas de oncologia, vi pessoas a chorar a morte ou a perda eminente de um ente querido que estava lá internado. Vi a dor nos olhos de cada uma daquelas pessoas. Vi, também, os doentes. Alguns mal se arrastavam, não tinham forças para falar nem para comer e outros faziam das tripas coração para alegrar os que pareciam estar numa situação mais delicada. Havia pessoas sozinhas, sem família, sem ninguém que lhes desse a mão num dos momentos mais duros das suas vidas. O choro estava sempre presente. A dor também. No fundo do corredor, enquanto esperava que a minha avó fosse chamada para a consulta ou para mais um exame necessário, eu via tudo aquilo sem encontrar palavras que definissem toda aquela tristeza. Eu via tudo aquilo sem conseguir acreditar que a realidade pudesse ser tão cruel e esmagadora.
Ali, naqueles corredores, aprendi a colocar-me no lugar dos outros, a ser solidário, a ter mais compaixão, a queixar-me menos das coisas, a agradecer o muito que já tenho, e, mais uma vez, a priorizar o que tem importância. Ali, naqueles corredores, aprendi que o dinheiro não é nada. A minha avó podia ter uma conta de milhões que nada a salvaria. E eu tenho percebido muito isto: as pessoas afundam-se no trabalho para ganhar dinheiro, o tempo que têm não lhes chega para nada, priorizam sempre coisas erradas, discutem por ninharias, zangam-se por parvoíces, viram costas por motivos absurdos… e tudo isso para quê?
É por ter presenciado e vivido tudo isto que quando vejo pessoas a queixarem-se por coisas tão estúpidas só me apetece mandá-las fazer voluntariado nos serviços oncológicos. Acredito que sairiam de lá outras pessoas. Melhores, com certeza.
Tudo o que passei com a minha avó nos seus últimos meses de vida tornou-me melhor. Emocionalmente, aprendi a sorrir mais e a desvalorizar os problemas. De nada adianta viver a queixar-me. Tenho é que acreditar que um dia será melhor e que tudo na vida passa. Até a própria vida.
Ahh e aproveito para vos dizer que está no cinema o filme «O Que de Verdade Importa» e que o dinheiro da bilheteira é todo ele para o IPO de Lisboa! Por isso, sejam generosos e toca a ir ver o filme. Eu já fui ver e acreditem, vale muito a pena!
Fábio Teixeira
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